Arquivo de urbanismo

… E AGORA, ALGO DIFERENTE

Posted in cycle to know with tags , , , , , on 18 de Outubro de 2013 by Humberto

Os níveis de debate têm sempre a ver com o estado em que os debatentes se encontram. Por isso é que há sempre, em matérias que digam respeito a tudo o que gira à volta das bicicletas, alguém que está tantos anos, ou mesmo mundos, à frente do nosso dia-a-dia ciclista.

Da mesma forma que podemos aprender muito sobre como resgatar a soberania e a independência para Portugal com a história recente de tantos países da América do Sul, podemos percorrer pedalando outras longitudes para, pelo menos tentar não repetir erros e, quem sabe, ser até inovadores.

Aqui fica um pequeno exemplo elucidativo, bem elucidativo até, do nível da “coisa”.

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ONDE PÁRA A COERÊNCIA?

Posted in cycle to know with tags , , , , on 5 de Outubro de 2011 by Humberto

Quem nunca mudou de opinião que atire a primeira pedra. Esta pode ser uma variante ao popular ditado muito bem adaptado ao que aqui me traz hoje. Podemos facilmente aceitar a mudança no pensar, ou melhor ainda a evolução das ideias, a renovação de conceitos, a alteração de mentalidades, como algo positivo e desejável. Mas se a mudança foi, partindo duma visão vanguardista e renovadora, na direcção de conceitos mais conservadores e reaccionários, podemos então sacar das pedras.

Outro ditado que também me acorre é o que afirma que até os asnos aprendem. Aprender não é mais que mudar de opinião, evoluir, avançar. Olhando à nossa volta e observando a paisagem urbana que nos rodeia podemos pelo menos ter a certeza de que não foram burros que permitiram, que desenharam e projectaram o espaço urbano, as nossa vilas e cidades, praças, ruas, avenidas, bairros. Foram apenas pessoas que não aprendem ou, de forma benévola, podemos antes dizer que aprender, aprendem mas muito devagar, muito mais devagar do que a velocidade a que tudo cresceu.

Visite-se a Pontinha, Vila Nova de Gaia, a Maia, Vila Franca, Telheiras, Campo Alegre, a Costa de Caparica, a Póvoa de Varzim e percebe-se que os valores urbanísticos, de qualidade de vida, de mobilidade, foram sempre os mesmos, arcaicos e condenados, provadamente falidos. À margem de  intervenções pontuais, de ténues tentativas de fazer melhor, na fotografia geral a imagem é a mesma. Umas pinceladas mais alegres aqui, uns tons mais suaves ali, mas o mesmo traço grosso, tordo, anodizado dá a Portugal este ar de anarquia urbana pequeno burguesa onde parece que as pessoas todas calçam carros e não sapatos.

Andamos nós, seguramente a maioria dos que por aqui passam, preocupados em construir ideias, em contribuir para a tal mudança de mentalidades. Ávidos de encontrar de entre os decisores aqueles que connosco partilhem esta necessidade de mudança das opiniões, de capacidade para corrigir erros e emendar gestos e vai não vai levamos uns socos que nos deixam outra vez à beira dum ataque de cepticismo. Ainda estou a falar do imbróglio na CML entre as vereação do ambiente e a da mobilidade sobre o sistema de bicicletas partilhadas para a capital.

Chegou-me pela mão dum guardião de memória este pequeno recorte do Jornal de Notícias publicado em 11 de Setembro de 2000, há portanto mais de onze anos, que transcreve a opinião dum senhor identificado como Urbanista, de sua graça Fernando Nunes da Silva. Pelo que se lê na palavra do senhor -está o texto integralmente entre aspas- fica-se a saber que o senhor acreditava num monte de coisas boas que tinham de ser feitas pelas autarquias. Pena foi o jornalista não lhe ter perguntado o que pensava o senhor Urbanista sobre as bicicletas de aluguer. Ou qual a opinião sobre o outro senhor agora colega dele na vereação…

Ficam as palavras do senhor Nunes da Silva e digam lá qual foi a direcção em que mudou a sua opinião?

EU NÃO VOU AO DOLCE VITA TEJO

Posted in cycle of live with tags , , , , , , , on 10 de Maio de 2011 by Humberto

foto de LINK2GREENWAY

Vi este poster pela primeira vez na estação de Carcavelos, numa solarenga manhã de fim de semana, enquanto esperava pelo comboio que me havia de levar até Algés. A bicicleta de todos os dia, apoiada no descanso, ao notar o meu olhar fixo, atentou também no alvo da minha incredulidade. Pareceu-me que para tentar animar-me, lembrou-me que naquele espaço gigantesco ao menos existe uma não menos gigantesca loja de bicicletas, como que a dizer-me que compreenderia acaso eu lá quisesse ir, mesmo sabendo ela que são bicicletas doutro pedigree.

Absorto nas letras e números, quais coordenadas GPS, que nos indicam o caminho, levei algum tempo a perceber que o meu ar de náusea não tinha passado despercebido à minha fiel companheira, mas logo tratei de a confortar. Nunca lá irei! disse-lhe e acrescentei, Nada existe naquele lugar que me faça falta. Tudo o que ali está representado é a pura negação daquilo em que acredito, da razão que me leva a procurar viver da maneira que vivo.

Neste efémero cartaz publicitário também está o comércio de rua bem como todos os temas académicos sobre modelos de desenvolvimento urbano e social. Mas o que me chamou a atenção foram as indicações viárias para chegar a um lugar chamado doce vida que fica num buraco longe do rio que lhe dá o nome e em que nem há baleias! Toda a simbologia da coisa é incongruente. E aquilo foi tudo feito por gente inteligente, paga por gente rica, a mesma gente que anda a vender um futuro a um povo que tem a cabeça enterrada na areia. Areia do deserto em que isto se tornará se não dermos o salto para longe desta linha!

O comboio apagou da minha vista este borrão sujo e deprimente, levou-me ao destino de onde segui pedalando ao ritmo da verdadeira vida, doce como o rio que aos poucos vê regressar os saltos dos corvineiros brincalhões. Parei numa esplanada e pedi uma bica em chávena fria. A Trek sorria feliz.

ÍNDIOS E CÓBOIS

Posted in cycle of sighns with tags , , , , on 9 de Março de 2011 by Humberto

As recentes imagens de um carro a colher bicicletas vieram juntar-se ao rol de pequenos filmes que registam estes momentos de demência que com demasiada regularidade ocorrem nas mais diferentes paragens. São o lado mais dramático dum conflito que opõe -como aliás ocorre com quase todos os conflitos- duas vítimas, com muito mais em comum do que parece à primeira vista: automobilistas e ciclistas.

Há décadas que as cidades portuguesas são moldadas, desenhadas e projectadas por técnicos que põem a utilização do transporte individual automóvel, o carro, no centro das prioridades. Na grande área metropolitana de Lisboa ainda hoje se constroem e alargam vias com três e mais faixas em cada sentido, cortam-se freguesias com variantes e vias rápidas, permite-se a ocupação de qualquer espaço livre por veículos estacionados. Grandes espaços comerciais onde os clientes apenas poderão chegar de carro são cartão de visita de todos os concelhos do distrito de Lisboa.

Esta mesma cidade onde a dimensão humana foi sendo ultrapassada pela voracidade do automóvel retribui moldando quem nela vive em pessoas embrutecidas pelo asfalto e pela velocidade. Mesmo em espaços donde o carro foi banido como na nova Praça do Comércio, o peão não ganhou nada mais que espaço livre e vazio. É indiscutivelmente essencial criar meios que permitam às pessoas chegar aos espaços públicos, aos jardins e praças, mas esse acesso só fará sentido se nos levar a destinos vivos, confortáveis e seguros. Um turista visitará o Terreiro do Paço uma vez, um lisboeta poderá lá ir todos os dias se a tal for convidado.

É pela valorização do cidadão e do espaço de encontro e interação que as cidades se tornam mais humanas. Da mesma forma que milhares de famílias se cruzam incógnitas dentro dos seus carros, também quando fora deles deambulam pelos corredores dos centros comerciais não estabelecem qualquer tipo de relação. Não debatem, não cruzam opiniões, não se conhecem. É ao tirar o condutor de dentro do carro que a cidade ficará mais humana e consequentemente geradora de menos conflitos. Tirar primazia ao automóvel é pois uma forma de moldar o condutor num melhor ser humano.

A reivindicação do direito a usar a estrada em pé de igualdade com os restantes veículos é mais que justa sobretudo olhando o caminho trilhado pelas regras do mercado liberal. O direito à escolha de meios de mobilidade não dependentes do automóvel faz parte do leque de opções de qualquer cidadão do mundo (dito) desenvolvido e ao qual (nos dizem) pertencemos. Ser assertivo no protesto e na argumentação requer mobilização mas especialmente objectivos. As imagens que nos chegaram do Brasil passaram nas televisões e foram assunto de imprensa mas não o suficiente para criar massa crítica e reflexão sobre o estado da arte, não justificaram tampouco um retrato sobre a bicicleta no país irmão ou sequer sobre os planos da Prefeitura de Porto Alegre para acomodar a circulação de velocípedes na malha viária.

Todas as pessoas que utilizam o carro vêem os custos da sua escolha -quando é de escolha realmente que se trata- a atingir o incomportável e têm que tomar decisões diárias que compensem os aumentos do IVA e do IRS, da água e do pão, da vida! Estas pessoas, nós, questionamos seguramente as próprias opções de mobilidade. O aumento na utilização dos transporte colectivos e a diminuição do trânsito automóvel na ponte 25 de Abril são dois exemplos actuais disto mesmo. Todos os actuais condutores são potenciais utilizadores da bicicleta. É assim que gosto de  ver quem se senta do outro lado dos vidros e não ouve o som do mar, o cantar dos pássaros nem dá os bons dias quando se cruza comigo.

PERDIDO NO TRÂNSITO

Posted in cycle of sighns with tags , , , on 12 de Janeiro de 2011 by Humberto

As desculpas para me ter ausentado das tarefas escriturarias são fáceis de apontar e a dificuldade seria em resumir as principais. Um pouco como encontrar argumentos para não sair de casa a pedalar e enfiar o traseiro num qualquer assento mais confortável, o tempo foi passando e os temas a acumularem-se na cabeça sem saírem pelas pontas dos dedos.

Nas minhas deambulações pelo mundo dos outros encontrei este filme. Ao ver as imagens da hamara india recordo o pavor com que entrei pela primeira vês no fluxo caótico de transito da capital Deli e de como ao fim de não muito tempo, guiava uma lambreta respeitando escrupulosamente a única regra  aceite universalmente pelos circunspectos condutores: horn please.

Um dos pensamento em jeito de e se que tenho quando leio qualquer coisa saída da equipa de arquitectos chefiada por Jan Gehl é qual teria sido o resultado para a cidade de Lisboa, se o dinheiro que foi entregue ao famosíssimo e aclamado Frank Gehry pelo seu trabalho num beco de Lisboa, tivesse sido dado ao colega dinamarquês para olhar, apenas olhar para a capital portuguesa.

Ao fim e ao cabo tudo se resume a escolhas e à coragem para decidir. Para enfrentar a Marginal, para atravessar uma rua em Chennai ou para mudar uma cidade.

MOBILIDADE ENCERRADA

Posted in cycle of sighns with tags , , , , on 4 de Outubro de 2010 by Humberto

O continuado programa de encerramento de escolas por este Portugal fora tem a meu ver alguma dificuldade em encaixar-se dentro da caixa dourada em que nos é servido. Uma verdadeira política de valorização da escola pública, de aposta séria na educação e desenvolvimento descentralizado do interior empobrecido, não se compadece com o encerramento de escolas! É antes resultado de opções neo-liberais e duma visão que nos reduz a todos à condição de despesa enquanto vai entregando os lucros ao largo do nosso futuro. Estes processos concentracionários das escolas e dos hospitais, das lojas do cidadão, das super-esquadras, têm atravessado governos de várias cores e nem sequer são originalmente lusitanos. Todos têm uma consequência comum: afastam as pessoas desses serviços.

A lógica do hipermercado e do centro-comercial podia ser uma corrente filosófica para esta gente. Uma super loja onde se pode encontrar tudo e comprar qualquer coisa sem ter de andar dum lado para o outro. Quem ainda não ouviu ou leu que “agora pode tratar de todos os documentos num único sitio”? Ou “desta forma podemos concentrar recursos”? Mas quantas pessoas vão à Loja do Cidadão para tratar de tudo? Eu dantes já tratava de tudo apenas num lugar, na Junta de Freguesia. Em qualquer freguesia havia uma loja das aguas e outra da electricidade e na repartição de finanças, que normalmente era ao lado da Junta, tratava do resto dos assuntos. E fazia isso tudo a pé!

Mas voltemos às escolas. Opiniões à parte, há uma questão que é sempre falada quando o tema é o encerramento de escola: o transporte -e relembro que estamos a falar de escolas que podem ter vinte e um alunos. Como é que se vão fazer chegar à nova escola os alunos que deixaram de a ter lá na aldeia? Não fiz nenhum levantamento, mas ao fechar-se cerca de setecentas escolas, deve haver crianças transferidas de várias escolas que agora vão todas para a mesma. Imaginem assim uma série de autocarros a virem de vários lugares e a confluírem para o mesmo ponto, para a nova escola. Criancinhas amarradas por modernos sistemas de retenção a acentos de pano azul, à mercê do mercado, dos seus valores e caprichos.

Sem ter números precisos -alguém terá? arrisco escrever que centenas de miúdos que iam a pé, de bicicleta, de skate para escolas relativamente próximas das suas residências, são agora totalmente dependentes de veículos motorizados. Pessoas que tratavam dos seus antigos bilhetes de identidade na JF, agora têm de ir ao Rossio!.Mulheres que poderiam caminhar até à sala de parto, agora têm a criança na ambulância porque não deu tempo de chegar ao hospital! Digam lá se isto não é também um problema de mobilidade?

Com a expansão dos subúrbios e o aumento exponencial dos habitantes desses bairros, foi-se transformando a forma como as pessoas se moviam nas suas viagens diárias. O transporte colectivo nunca acompanhou o crescimento urbanístico pelo que o carro passou a ser omnipresente e seus donos omnipotentes. As famílias passaram a entregar parte do que poupavam na habitação periférica na compra do segundo carro e a rotina assimilou o automóvel definitivamente. Deixar os miúdos na escola de carro,  seguir em pará-arranca para o emprego, regressar em arranca-pará, trocar o carro pelo carrinho e continuar engarrafado na caixa do hiper, passar na casa da sogra, na lavandaria, levar os putos à piscina, ir ao ginásio, ao dentista, tomar café, comprar o jornal, à farmácia.

O tempo que dantes era usado para saltitar a pé de loja em loja de bairro, passou a ser perdido nos engarrafados IPs e ICs. Caminha-se pouco e quase não se pedala. A obesidade transforma-se num problema sério e os diabetes alastram. O asfalto cobre cada recanto das nossas cidades e os parques de estacionamento são forrados a calçada. As crianças foram expulsas da rua e empilhadas em parques assépticos donde nunca saem sequer para explorar o seu quarteirão. O que dantes se fazia no dia-a-dia, é nos agora recomendado que o façamos numa sala acondicionada e fechada, em frente a um televisor que nos vende um estilo de vida que não queremos.

A forma como se desenha o país, o campo e as cidades, as vilas, as aldeias, a forma como os poderes distribuem as infraestruturas e os serviços pelo território, para lá de ser decisivo na fixação das pessoas, define toda uma malha de mobilidade geradora ela própria de dinâmicas estruturantes. Não se pode descentralizar concentrando, não se pode agregar mantendo distâncias de proximidade. Centenas de crianças passaram a estar mais longe da escola e o país mais dependente do petróleo. E ainda lhes dizem, nos dizem, que é para nosso bem?

JAIME LERNER TALKS

Posted in cycle to know with tags , , , , , on 10 de Setembro de 2010 by Humberto

Já aqui se falou de Jaime Lerner e do papel que teve em Curitiba, Brasil e no mundo.

Segundo a revista TIME, é um do 25 pensadores mais influentes do mundo e o único que se expressa em Português!

Deu recentemente uma entrevista a Ricardo Alexandre para a Antena 1 que vale a pena ouvir e partilhar.

Depois de ouvir a entrevista, pode ver aqui em ⇓ o senhor nas TED Talks, curiosamente patrocinada por uma marca de automóveis…

E mais não digo, porque vai falar um mestre!

LEITURA DE FIM-DE-SEMANA ou APRENDER, APRENDER SEMPRE

Posted in cycle of sighns with tags , , , , , , on 19 de Dezembro de 2009 by Humberto

ENTRE O QUERER E O PODER

Posted in cycle of sighns with tags , , , , , , , on 6 de Novembro de 2009 by Humberto

O papel que o senhor Enrique Peñalosa teve em Bogotá e a importância do seu legado é enorme. Num continente em que as questões da mobilidade ainda eram, e são, menos valorizadas que na Europa, Bogotá provou que é possível fazer muito com pouco.

Mas Bogotá e Peñalosa beberam muito na experiência pioneira de Curitiba, Brasil, e nas ideias de Ivo Arzua e depois na acção de Jaime Lerner. O Plano Director de Curitiba e o Sistema Trinário de Transporte fundaram o que viria a ser um exemplo seguido em cidades de toda a América.

Na actualidade existe um senhor arquitecto que lidera um grupo de trabalho presente nas urbes mais revolucionárias em matéria de cidades para as pessoas: Jan Gehl. Com intervenções que atravessam os seis continentes, aponta os erros acumulados por décadas de decisões erradas, mas sobretudo projecta soluções integradas, simples e eficazes.

No nosso país, nas nossas Universidades, nos nossos gabinetes de arquitectura há seguramente muitos bons técnicos. Pessoas que por méritos vários já provaram serem capazes de transformar para melhor muito do nosso país.

Há também muita pequenez de espírito. Muito caciquismo, muito sobranceirismo e snobismo. E pouca humildade para reconhecer que todos temos uma palavra a dizer. Para não falar nos interesses instalados, tantas vezes de face pouco oculta…

No fundo, a diferença de pessoas como Penalosa, Lerner e Gehl não é a obra, mas a capacidade que têm de estudar, interpretar e influenciar. Por isso ficam para a história, não porque querem, mas porque podem!

O SEU A SEU DONO

Posted in cycle of sighns with tags , , , , , , , , , , , , , , , , on 20 de Setembro de 2009 by Humberto

Embora não tenha dados estatísticos, arrisco dizer que sair de casa-entrar no carro-deixar-se conduzir pelo fluir do trânsito-estacionar, é, grosso modo, a rotina matinal e diária de muito de nós.

Com pouco esforço e usando uma expressão da moda, facilmente se consegue esmiuçar cada um destes passos e perceber por exemplo que, no particular da vida de cada uma, entrar no carro pode ser no abrigo duma garagem ou ao relento em cima da passadeira que há noite ninguém multa, e que a viagem duns é feita por ruas frias e cinzentas e a doutros encandeados do sol nascente lá longe no Tejo oriental. E que estacionar pode ser tarefa mais ou menos fácil, não dependendo isso apenas da destreza do condutor, mas sobretudo da hora a que se chega e do destino onde se arriba.

Pearl Street Triangle Plaza, DUMBO, Brooklyn

O espaço necessário para deixar parados todos os carros que entram na cidade de Lisboa, ou noutras que isto de carros está o país muito bem servido, não é pouco e se pensarmos no valor que tem o metro quadrado de terreno urbano percebemos quantos euros de terra ocupa um estacionamento. Imaginemos que cada pessoa que não se faz chegar ao trabalho de carro, exige o mesmo espaço à Câmara para estender uma espreguiçadeira ou montar uma mesa de piquenique e almoçar com os colegas. Poderia sempre argumentar que não polui e humaniza a cidade. Porque raio haveria de ter menos direito ao estacionamento?

O transporte público, a bicicleta e outros meios de transporte suave (adoro esta expressão e lembro-me de certos troços deixados em “paralelo” da ciclovia do Tejo) são as opções que as cidades devem incentivar.  São opções democráticas porque tratam todos da mesma maneira e devolvem aos cidadãos o poder sobre as suas ruas. Os espaços pedonais que sirvam todos os cidadãos, quer sejam condutores ou não, os espaços verdes, os bancos onde podemos parar e descansar, as esplanadas, são sinais de cidades democráticas onde o valor da terra -um bem de todos que é único e que não se fabrica mais- é justamente repartido por todos.

Continuar a construir túneis, avenidas pretas e largas, alamedas de quatro faixas, perímetros listados de laranja e branco, despejar contentores aos milhares no centro da cidade, é continuar a entregar o espaço que a todos pertence a apenas alguns, os quais, as mais das vezes, nada pagam por esse privilegio. É continuar a investir os fundos escassos e valiosos num modelo de cidade que tem os dias contados, e que nos condena a viver numa urbe que nos grita aos ouvidos: Não vos quero aqui! Cidade com muros e ameias onde não somos bem vindos, a não ser que nos apresentemos revestidos de plástico e chapa.

Copenhaga, Amesterdão, Melboourne, Nova Iorque, Almada, são algumas das cidade exemplares no que à sustentabilidade concerne e isso deve-se a trabalho intenso e persistente ao longo de anos. Quando as decisões políticas começaram a encurralar o carro e a tirar-lhe o protagonismo houve o mesmo tipo de resistências que por cá se ouve por parte dos homólogos protagonistas. A sensação que menos um lugar à porta da loja deixará mais um consumidor fora do negócio, é um entendimento normal, mesmo quando visto longe da luta partidária pelo poder autárquico. Em Copenhaga esse entendimento mudou.

As cidades de Bogotá, Dublin, Londres, Praga, Roterdão, Zurique, Milão, Malmö , Sevilha, dizem-nos que é possível reivindicar o espaço que por tempo demasiado nos foi subtraído. Basta apenas que se faça por isso. Duma vez por todas!

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