Arquivo de Lisboa

BICICLETAS PARA A ESTRADA JÁ!

Posted in cycle of sighns with tags , , on 18 de Novembro de 2013 by Humberto

cais das colunas

Tenho passado nos últimos meses, muitas horas ali para os lados do Terreiro do Paço. Volta não volta e estou de plantão à porta do Ministério da Troika à espera que mais um rol de maus presságios escorra dos gabinetes, desça pelos microfones e se abata sobre o nosso futuro. Pela porta da rua entra a luz dum Tejo a correr para o mar mas sem força para lavar a cidade nem levar a mágoas. Lá fora passam bêbados curiosos, namorados resignados, desempregados arrumados e arrumadores empregados, polícias desesperados, prostitutas baratas, turistas assustados, bombeiros apressados, donas de casa atrasadas, carros a apitar, pedreiros a xingar. E muitas bicicletas.

Raras vão sendo as oportunidades de prender o olhar a Lisboa e para ouvir falar de liberdade escolhi descer ao rio e embalar-me pelo piar das gaivotas. Estava o céu vestido de azul e aquecia a fria manhã de domingo. Uma pequena praia deixava-se mostrar na maré baixa e o rapaz que faz do cais palco encantava tainhas e um par de alforrecas asfixiadas, enquanto todos os outros seres vivos tentavam imaginar como seria só ouvir o rio. A calmaria das águas contrastava com a corrente de ciclistas equipados a preceito para uma volta ao Alqueva, que ia e vinham pela estreita calçada. Mas porque raio não vai aquela gente toda na estrada?

Passam diariamente dezenas de bicicletas na cidade que se estende de Santa Apolónia ao Cais do Sodré. Muitas são levadas pela estrada, altivas e afirmativas, donas do seu lugar. Outras mais amedrontadas vão cuidadosas pelo passeio do lado do antigo Paço e deixam-se ficar a fazer preguiçosos oitos na Praça do Comércio. Muitas seguem ainda covardemente, fugazes por entre quem foge para apanhar o barco, pelo passeio em frente ao Cais das Colunas, esgueiram-se por entre distraídos fotógrafos de ocasião, driblam carrinhos de bebé, rabeando a sorte pelo meio do azar do peão.

O que faz um tipo sair de casa enfiado em lycra dos pés à cabeça, pôr-se em cima dumas boas centenas de euros e, em vez de ir pedalar para o monte, ir chatear quem vai a passear? Pelo passeio! Parecem putos, uma cambada de miúdos medricas mascarados de homens, todos equipados como nas fotografias dos catálogos da marca da bicicleta preferida, mas que não se atrevem a pôr um pedal na estrada. Às tantas, ia eu na direcção do poente, ali onde as eternas obras da Ribeira das Naus obrigam a caminhar por um corredor de grades, ouço um compincha a dizer ao outro “até Santos? mas assim tem que ser pela estrada…”. O mesmo pessoal que afugenta aos gritos e solta impropérios de cada vez que um peão pisa aquela espécie de ciclocoisa mais à frente a caminho de Belém, foge para a calçada como se o asfalto queimasse os pneus xpto-de-corrida! Até quando? Apre!!!

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A BICICLETA ESTÁ A PASSAR POR AQUI

Posted in cycle to know with tags , , , , on 8 de Novembro de 2013 by Humberto

fotografia

Está a nascer a mais fantástica loja de bicicletas de Lisboa e arredores! Tal como uma bicicleta, tem três pontos de apoio.

Os pedais do projecto são a RCICLA que mudou as armas e as bagagens de Algés para a 24 de Julho. Bicicletas com personalidade, montadas ao gosto de cada cliente mas mais importante, de acordo com o bolso de cada um. Além de bicicletas completas, há bicicletas às peças -literalmente! acessórios vintage e uma oficina onde a experiência se alia à boa disposição.

Dia 24 de Novembro abre, por assim dizer o guiador: a RCICLA RENTALS. Um projecto único porque não permite concorrência no preço nem no serviço. Bicicletas perfeitas para conhecer Lisboa a um preço imbatível: 5€/dia! A ideia veio do país das bicicletas e se é verdade que Lisboa não é Amesterdão, mais verdade é que há ideias que podem e devem ser replicadas com garantia de sucesso. A RCICLA RENTALS é para quem quer conhecer a cidade e ficar com trocos no bolso para a bucha.

A terceira novidade, que podemos considerar o assento desta bicicleta, é a reabertura do GRÉMIO, o saudoso café para quem tem pedal (eu escrevi mesmo isto?). Um espaço aberto à partilha, onde a bicicleta será o ponto de partida para a conversa, exposições, livros, música, Le Tour, e o mais que houver.

Independentemente dos caminhos por onde as ciclovias e outras minudências nos levarem, a bicicleta está de certeza a passar por aqui!

MENTALIDADE SEGURA

Posted in cycle of sighns with tags , , , , , on 5 de Novembro de 2013 by Humberto

esquemaA segurança dum ciclista na estrada é posta em causa não pela acção concreta dos automobilistas mas sobretudo pelas ideias de segurança que tem a grande maioria dos automobilistas. Eu explico.

É legítimo um automobilista, ou qualquer outra pessoa, achar que quem pedala na estrada põe em risco a própria segurança, e até a segurança dele, automobilista. É razoável que quem de dentro dum automóvel, olha aqueles que se transportam em cima duma estrutura frágil, sem nada que os proteja dos elementos para além da própria pele e enfrentam na mesma arena máquinas muito mais fortes e velozes, pareça estar a arriscar muito e dessa forma, a pôr em risco a própria segurança.

Por haver um efectivo risco quando se anda de bicicleta no meio do trânsito automóvel, é reconhecida a necessidade de adaptar e actualizar a legislação, especialmente o Código da Estrada (CE), de maneira a aumentar a segurança para todos os utilizadores das vias. Mas uma vez publicadas as regras ideais, ficaríamos todos mais seguros? Como se implementa uma lei que obriga os automobilistas a passarem a pelo menos metro e meio dum bicicleta?

Um rápido olhar pela janela e damo-nos conta de como, apesar de tantas regras e sinais, o estacionamento automóvel é livre. quase anárquico. Ou como as velocidades impostas como limite, são na verdade e quase sempre as velocidades mínimas.

Não é o CE que vai fazer os automobilistas deixarem de me passar tangentes na Marginal. Muito menos será a polícia a medir as ultrapassagens irregulares. Quando tenho de ser automobilista existe uma única razão pela qual me afasto dum ciclista para uma distância segura e só então o ultrapasso. E essa é a única razão que fará com que outro qualquer automobilista se afaste também: a consciência de que ao agir doutra maneira, poria sempre uma vida em risco.

Em cidades onde a bicicleta é um alien, ainda que um alien simpático, é impossível circular sem rolar pelo passeio, desmontar sempre que se cruza numa passadeira, respeitar todos os semáforos ou nunca passar um verde-tinto, descer uma rua em contra-mão. Quer dizer, não é que seja uma impraticabilidade pura, é mais uma coisa natural já que um ciclista sente-se sempre mais próximo do peão que dum veículo motorizado. Andamos, vemos e ouvimos como um peão e é normal que interajamos com o meio duma semelhante maneira.

Faz sentido tirar as bicicletas do passeio quando se continuam a desenhar ciclovias pelo meio da calçada? Estender uma carpete vermelha pelo meio dum velho e esburacado tapete não é um convite ao “passeio”? Claro que é! É mais ou menos como marcar um seminário sobre nutrição na Confeitaria do Marquês.

A alteração das regras só é motor para mudar as mentalidades se houver implementação efectiva ditas. Embelezar os calhamaços sem cuidar do lado prático pode até contribuir para a ideia de que a “lei” não serve para nada. Tirar as bicicletas do passeio porque assim obriga a segurança dos peões, vai fazer com que, à medida que em Lisboa e noutras cidades, forem crescendo as áreas pedonais, estas sejam proibidas aos ciclistas. E isso não faz sentido nenhum!

Neste interessante artigo é sugerido o que pode a cultura da bicicleta no Japão ensinar ao Reino-Unido. Podemos aprender todos uns com os outros desde que acertemos na ideia que o que é essencial mudar são as mentalidades.

autocarro

VIVA O PASSE SOCIAL!

Posted in cycle to know with tags , , , , on 21 de Agosto de 2012 by Humberto

Decidi dar a cada um dos quatro temas recorrentes enunciados no artigo anterior, um texto. Hoje escrevi sobre os transportes públicos, o próximo artigo será dedicado ao automóvel, o seguinte às ciclovias e por último escreverei sobre o capacete. Sempre com a perspectiva de quem vai no selim da bicicleta.

—§—

A empresa que não queira ter de pagar aos seus funcionários os custos da depêndencia do carro particular para ir trabalhar não será tão sensível aos chamados “bons acessos rodoviários”. A empresa à qual os seus trabalhadores chegam por transporte público sabe que têm mais qualidade de vida. Têm custos de mobilidade muito inferiores aos do trabalhador que necessita do automóvel, têm mais rendimento disponível. São melhores consumidores, porque consomem mais.

O transporte colectivo é o meio mais eficiente de mobilidade urbana. Partilhando um vértice do triângulo com o automóvel e com a bicicleta, oferece o conforto dum e a liberdade do outro. A integração dos  sistemas de transporte duma cidade numa rede intermodal reveste-se duma importância muito para lá da quantidade de passageiros que transporta. Mais que mover multidões em barcos, eléctricos, autocarros, metros e comboios, o sistema de transportes conduz o crescimento da urbe, marca o ritmo, recria paixões. Os percursos e os horário são as ferramentas com que a rede molda a forma e o conteúdo da cidade.

Dentro duma carruagem há livros, música, encontros, assaltos, drama, destruição, ideias, soluções, compra e venda. Da janela do eléctrico encomenda-se o almoço, entra o jornal, dá-se um calduço, ouve-se os bons dias e atira-se um piropo. Pela janela do eléctrico entra o cheiro do rio e do pregão. Da janela do eléctrico vê-se a paragem, e a puta, o turista, o bancário, o carteirista, o soldado e o polícia.  Dentro dum autocarro vai um bairro que passa por outro bairro e por outro, até que se enche de toda uma cidade. Todas umas vidas. E é esta cidade cheia de vidas, a despertar com os primeiros raios de luz, que vê quem vem e atravessa o rio. Há lá vista mais bonita?

O papel chave que os transportes públicos têm na vida de milhões de cidadãos e a importância enquanto geradores e dinamizadores de actividade económica, tornam-nos presa dos ultra-neoliberais que têm gerido e gerem os destinos da Europa. Por cá há muito que, ao mesmo tempo que os transportes públicos são conduzidos por avenidas onde apenas circula o interesse comercial, é desvalorizada a importância social dos serviços e arrasada a imagem pública dos funcionários. Após a aplicação das mais recentes decisões políticas na rede de transportes nacional, os transportes colectivos de Lisboa perderam passageiros mas aumentaram as receitas.

Embora haja menos pessoas a andar de transportes públicos -e isso deve-se a diversas razões, houve um aumento significativo no valor cobrado pelos bilhetes. Foram suprimidos horários e fechadas carreiras, a qualidade do serviço de alguns operadores diminuiu significativamente a par da redução dos incentivos a grupos específicos de passageiros. E o resultado qual foi? Menos utentes pagam mais. No Reino Unido, três décadas depois da choque privatizador tatcheriano, discute-se a re-nacionalização dos caminhos de ferro britânicos, numa altura em que se anunciam aumentos de mais de 6% nos bilhetes.

O transporte colectivo é de tal forma vital que os seus destinos têm de se manter na esfera pública. Só dessa forma preservam a sua posição de vanguarda na obra que é fazer a cidade. O transporte público é o grande aliado dos meios suaves por ser o verdadeiro predador do automóvel. Os utilizadores de bicicleta, mesmo que não sejam utentes, são dos maiores beneficiários duma boa rede intermodal. E a eficiência da rede de transportes é conseguida, não com um redutor deve-a-haver de mercearia mas pela capacidade que tem de irrigar de carne e sangue humano as artérias, ruas e avenidas, levando vida a todo o corpo da cidade!

A BICICLETA TEM AS COSTAS LARGAS

Posted in cycle of sighns with tags , , , on 25 de Maio de 2012 by Humberto

Que anda meio mundo a enganar outro meio, mais coisa menos coisa e fora uns pozinhos, já o povo, sabedor e experimentado mas nem sempre aprendedor, diz. Que isto da bicicleta tem sido uma forma de gente muito dada à palavra fácil trepar ao cume da popularidade sempre tão rentável em votos e poleiros, não me tenho cansando de apontar. E acrescento: a bicicleta tem as costas realmente muita largas!

O regresso do festival de música rock ao alto de Marvila deu mais uma oportunidade de, a pretexto do desfraldar duns quantos mais metros de ciclovia alfacinha, estenderem-se ao comprido os habilidosos do costume. Tirando o ar casual do Caetano e uns quantos senhores que não saem de casa sem sentirem as carnes bem aconchegadas, a filha do Roberto que se não pedala, malha muito, e mais uns quantos pedalantes de inaugurais, as fotografias são até cómicas. É que isto das bicicletas, quando toca a andar, requer equilíbrio senhores, equilíbrio!

Mais do que me ficar a rir da azelhice alheia ou apenas dar lastro à má língua anti-festivaleira, até porque vou finalmente poder rever o boss em Portugal, a ideia de poder fazer o regresso a casa montado e a pedalar é muito convidativa -não fora o facto de cá para os meus caminhos esta passadeira rosa não servir para nada, quero apenas chamar a atenção para pequenos detalhes. Acredito que são os detalhes que definem se uma coisa é bem ou apenas feita. São os pequenos pormenores que fazem a diferença. São as picuinhices que dão o brilho. Mas… nem tudo o que brilha é oiro.

Reparem nas manetas de travão da bicicleta do senhor da boina. Deve ser adepto duma cena mais racing

A quantidade de fotografias em que o José Caetano aparece ao lado do António Costa!

Onde está a ciclovia?

A boa da Roberta deve ficar a pensar que andar de bicicleta em Lisboa dá barriga!

E para terminar, a revista Caras diz que o José Sá Fernandes é que é o presidente da FPCUB. Sim, era só o que nos faltava!

AO CUIDADO DO SENHOR COSTA

Posted in cycle of sighns with tags , , , on 28 de Março de 2012 by Humberto

A condição fundamental para acontecer a tão necessária transformação na cidade de Lisboa no que à mobilidade diz respeito, é vontade política. E digo Lisboa como posso dizer qualquer outra cidade já que a transformação necessária que por aqui é costumeiro falar-se, faz falta no país como um todo, logo também nas suas partes. A vontade política é a que permitirá que a questão da mobilidade seja olhada como prioritária, que a necessidade da transformação seja entendida como urgente. Que se coordenem gabinetes, pensamento, recursos e actos. Mas mais importante, é a vontade política que permitirá que se construa um discurso capaz de resistir aos velhos do Restelo conquistando os demais cidadãos da, provando-lhes que a transformação é benéfica para a cidade e melhora efectivamente a qualidade de vida de quem a habita e visita. Tomemos o exemplo da capital. A actual presidência manifestou vontade política para alterar o estado das coisas ainda antes de ocuparem os gabinete. Existia a tal condição fundamental, portanto poder-se-ia dizer que a transformação estava em marcha.

A revisão dos valores assumidos nas questões da mobilidade está a acontecer um pouco por todo o mundo. Muitas cidades e Estados empreendem neste momento projectos que lidam com problemas particulares e com outros mais globais, mas em todos a grande novidade é serem pensados desde a perspectiva do olhar e à velocidade do andar do peão. A humanização das cidades não é mais que a devolução ao peão do lugar centrar que lhe é devido por direito. Esta abordagem leva à redução da área dedicada ao trânsito automóvel e da velocidade de circulação; gestão do estacionamento -quando não é por e simplesmente abolido; desactivação dos sentidos únicos; incremento dos sistemas colectivos de transporte pelo aumento da oferta e integração do sistema tarifário; aumento das zonas pedonais seja para circulação ou para descanso; construção de infraestruturas para a circulação em segurança de bicicletas; remoção ou adaptação de barreiras à circulação de pessoas. Em traços gerais tudo passa um pouco por implementar este tipo de soluções, independentemente do estádio de desenvolvimento em que a cidades se encontram. A bicicleta ganha particular importância por ser o meio de transporte que permite verdadeira e total liberdade de movimentos no espaço urbano, solucionando não só o problema do utilizador como também o problema dos à sua volta.

Não é tarefa fácil enfrentar situações estabelecidas desde tempos imemoriais, poderes seculares, pensamentos encrostados. A batalha pela mudança é sempre difícil e por isso requer ser bem planeada. É necessário convencer os visados que as alterações serão positivas para os próprios para lhes ganhar o apoio e tentar conquistar os cépticos. Há que libertar muita informação. Monitorizar cada alteração, fazer ajustes à medida que as medidas forem sendo transpostas para o terreno, ir construindo como se fosse um Lego, peça a peça, cada uma em cima da outra, bem encaixada, para que vá fazendo sentido na cabeça de quem vê, de quem vota. Voltamos ao exemplo da capital. Em Lisboa os transportes públicas estão mais caros e oferecem pior serviço. Continua a ser fácil estacionar sem pagar, com muitas zonas sem parquímetro e tolerância para com o estacionamento abusivo e ilegal. Não há fiscalização de limite de velocidade para além dos risíveis radares. Continuam a ser projectados parques de estacionamento em zonas nobres e bem servidas de TP. As ciclovias contribuem para a redução dos passeios oferecendo ainda por cima, uma muito melhor superfície para andar a pé que a mal tratada calçada portuguesa. Rede de ciclovias desintegrada e pensada apenas em total de quilómetros -basta ver que a CML contabiliza os trilhos de Monsanto da mesma maneira que os urbanos. Se somarmos a isto uma vereação de candeias às avessas e um presidente sem mão nos boys, temos um quadro dramático que atinge proporções trágicas quando consultamos alguns lugares.

Quando ouço falar na dificuldade que é mudar alguma coisa num cidade como Lisboa e no tempo que estas coisas levam sempre, costumo responder que difícil é mudar em Londres com os seus mais de dez milhões de habitantes, ou em Paris, Melbourne, Curitiba, ou em Sevilha que é a capital da mais pobre região de Espanha e no entanto… Cidades onde a vontade política existe mesmo e não é apenas mais uma peça na básica retórica demagógica que sabe que não se apanham moscas com vinagre. O filme que se segue não é novo mas mantém muita actualidade. Vem de New York, onde nem tudo é Manhattan, mas cujo conservador mayor teve a vontade política e a capacidade de fazer. Sabendo todos do atraso com que os políticos do arco do poder lusitano reagem à realidade, espero que seja visto e ouvido por quem tem responsabilidades e os faça corar de vergonha pelo tempo que andam a empatar, pela falta de tomates para fazer alguma coisa verdadeiramente de jeito!

DE COERÊNCIAS E PROPORCIONALIDADES

Posted in cycle of live with tags , , , on 20 de Março de 2012 by Humberto

A frequência com que me têm pedido conselhos para a escolha duma bicicleta tem sido inversamente proporcional à minha assiduidade escrevinhadora. Partilhar com alguém a decisão de comprar uma bicicleta no contexto em que me pedem opinião, é uma verdadeira honra. E é também um sinal que anda por aí muito boa gente repensar nas coisas que por aqui se julgam relevantes. Não precisamos partilhar a mesma opinião sobre o sentido da vida mas gostamos de bicicletas.

Há cada vez mais bicicletas nas ruas. Em qualquer parte de cidade de Lisboa já não surpreende ver uma bicicleta a passar, pedalada por um cidadão com ar de quem vai na sua vida normal. Há até quem em tempos de incerteza, aposte no negócio de bicicletas e ainda por cima com preços da outra Europa! Florescem na blogoesfera bicicletas pedaladas por esse país adentro. São editados a revista B e o jornal Pedal, dedicados ambos à bicicleta-de-trazer-pela-cidade. Surgem espaços onde se convida a bicicleta a entrar, a viver a bicicleta. Há hoje, comparativamente claro, bicicletas por todo o lado!

A bicicleta é, desde que se tornou comum, o mais democrático dos veículos. Foi sempre um transporte libertador e, de alguma forma, livre. A bicicleta serve como afirmação da necessidade de modelos de vida e mobilidade alternativos sendo uma opção voluntária e ponderada para muitos ao mesmo tempo que para outros é a única alternativa, é mesmo o único meio de transporte disponível, acessível. Independentemente das motivações ou constrangimentos, até aí somos todos iguais, quando pedalamos: é preciso ter perninhas.

Respondendo à curiosidade por ter optado pela bicicleta para se deslocar em Manhattan, David Byrne respondeu que a escolha nada tinha a ver com preocupações ambientais nem era resultado de qualquer dilema filosófico, prendia-se apenas com o facto de, na sua cidade, ser a maneira mais rápida de chegar do ponto A ou ponto B. Olhando para o percurso de artista e, mais recentemente a intervenção activa na defesa da bicicleta urbana do autor de “Nothing But Flowers”, não lhe são seguramente indiferentes as encruzilhadas que o Homem do século XXI tem pela frente. A bicicleta é apenas uma coerência mais na sua existência.

E é de certeza por coerência que o velocípede faz parte da vida de muitos de nós. Sem grandes debates filosóficos ou questões morais. Simplesmente porque precisamos delas para nos sentir melhor, porque não temos outra maneira de ir de aqui-prali, porque a gasolina está pela hora da morte, porque o ambiente agradece, porque odiamos automóveis, et cetera & tal… Vá uma pessoa desleixar-se e a bicicleta entra de tal maneira na nossa vida que alguns até lhe dedicam -imagine-se!, blogs! Arrisco mesmo, e sem qualquer base cientifica, que nunca houve tanto estudo, tanta tese académica sobre a utilização da bicicleta e assuntos adjacentes. O que é coerente.

Ela, a bicicleta, move-se e, entretanto o tempo passa. Os poderes acomodam as massas e a crítica esbate-se com medo de desagradar e ficar de fora da fotografia. No Parlamento perde-se a oportunidade de alterar efectivamente o Código da Estrada e sugere-se em vez uma oportunidade ao Governo de ficar com os louros. Basta ver o que aconteceu com a chamada lei das 125, e perceber que o que se aprovou foi uma perda de tempo. As ciclovias do Zé são cada vez mais certificadas de inúteis na promoção duma cidade ciclável. Quando não geram conflito com o peão roubando-lhe o já precioso espaço dos passeios, servem de poiso ao inimputável carro!

Não é preciso ser doutor para perceber que a bicicleta mexe com interesses, alguns instalados outros em fase de instalação. A escola da vida ensina-nos que no entretanto saem prejudicados os interesses dos do costume, do cidadão que só quer seguir a sua vida, pedalando para todo o lado, seja essa escolha mais ou menos académica. Porque é simplesmente mais rápido ou porque não é amigo do Gaspar, o tal que anda a deixar o cidadão cada vez mais curto de massas. Ainda por cima é mais saudável para todos! Ao fim e ao cabo é tudo uma questão de coerência

DE GERHY A GEHL

Posted in cycle to know with tags , , , , on 17 de Dezembro de 2011 by Humberto

Há uns quantos anos a cidade de Lisboa teve por presidente alguém cuja obra que marcou o seu condado foi um buraco em forma de túnel com o mérito prometido e alcançado de meter mais depressa, mais carros dentro da cidade.

Esse senhor, dando seguimento ao imbróglio que ligou a CML e a empresa Bragaparques, os terrenos da Feira Popular e o Parque Mayer, resolveu contratar um gabinete de arquitectura conhecido por obras que não ficam exactamente escondidos em becos… conhecidos autores de alguns museus Guggenheim e do hotel Marqués de Riscal, Espanha.

Pelos serviços contratados à Gehry Partners foi paga uma quantia, digo eu… alta. E acrescento: foi paga muito justamente, já que o trabalho tem de ser remunerado, e afirmo-o porque andam por aí uns senhores amigos do ex-presidente a tentar impor o contrário, mas isso é outra história. Ou talvez não…

Bom, mas dizia eu que o contrato foi cumprido na medida do executado. Uns desenhos e umas reuniões e passa para cá os euros. Não escrevo considerações sobre a obra do mestre canadiano. A tanto não me alcança a pretensão! Sendo um arquitecto com obra espalhada por todo o mundo, considero um privilégio para a capital ter um edifício projectado pela dimensão de Gehry.

Não seria apenas o ego do edil presidente que engordaria com a assinatura de Frank Gehry pespegada numa parede de Lisboa. Eu, que associo à linha intelectual santanista os violinos de Chopin ou o CCBamarracho, reconheço modestamente que gostaria de também viver numa cidade Gehry, Lloyd Wright, Soutinho, Siza, Ando, Calatrava.

Duas ordens de razão assistem porém às minha dúvidas sobre a empresa do então autarca: primeiro, o lugar escolhido para acolher a mestria do arquitecto, a imponência do seu talento confinado num beco sombrio e segundo, relevância do projecto nas necessidades da cidade. Tanto por tão pouco.

De tudo quanto se gastou -ainda por cima em vão! o mais caro foi o tempo. Durante meses foi andando um comboio que chegou a lugar nenhum. O dinheiro foi-se e nada apareceu no seu lugar. O tempo passou e não se pode voltar atrás.

Quanto tempo e quanto dinheiro custaria ter pago por algo que em minha opinião, tarda por chegar: um projecto verdadeiro para reformar a rede viária? Um estudo sobre mobilidade e consequente acção transformadora? Quanto custaria, em tempo e em dinheiro, chamar Jan Gehl e Helle Søholt para virem conhecer o Cais do Sodré e a Mouraria, as Avenidas Novas e a Gulbenkian, o Fado e a luz -uma e outra, o maduro e o verde, a Senhora do Monte e as tasquinhas de Marvila, o Mercado da Ribeira e as bifanas, as chamussas do Martim Moniz?

Mas sobretudo, o quando se ganharia em dinheiro e em tempo!

O pequeno filme que se segue é uma viagem por Nova Iorque feita em jeito de estudo in loco por gente que passa a vida a tornar as cidades dos outros um nadinha melhores. Enquanto grande fã dos dotes musicais e escrevinhadores do anfitrião Byrne, ciclista aficionado e praticante, desde já me proponho para ser o Byrne alfacinha. Ofereço o meu tempo e, se for por ajuste directo, levo baratinho.

O CALDEIRÃO DAS MASSAS

Posted in cycle of sighns with tags , , on 3 de Novembro de 2011 by Humberto

Nunca participei no desfile da Massa Crítica. Por duas razões fundamentais, primeiro porque vivo e trabalho fora de Lisboa, segundo porque ainda não me senti motivado o suficiente para ir ao Marquês de Pombal numa sexta-feira à tarde. Tampouco participei em outra qualquer Massa Crítica dentro ou fora do país, no entanto acompanho com interesse este movimento mundial nas suas várias versões incluído as portuguesas. As mais de trezentas cidades onde a cada última sexta-feira do mês, deslizam largos milhares de ciclistas são cenário dum dos maiores movimentos à escala global. São cenário e testemunha do papel que este movimento iniciado em São Francisco nos Estados Unidos, em 1992 tem tido numa certa forma de divulgar a bicicleta enquanto alternativa para a mobilidade urbana.

Cada cidade recria à sua maneira o desfile tendo por base o guião original. Ciclistas urbanos, mas não só, reúnem-se todas as derradeiras sextas-feira de cada mês num lugar fixo e decidem in loco o percurso e o destino. Circulando em massa compacta reivindicam para a bicicleta o espaço que de forma individual lhes está proibido pelo omnipresente automóvel em todos os outros dias do mês. À medida que percorrem as ruas e se cruzam com automobilistas e peões aproveitam para chamar a atenção para as questões da mobilidade, da bicicleta e doutros problemas presentes nas distintas realidades locais. A reacção aos desfiles Massa Crítica por parte dos cidadãos e das autoridades é na maioria das cidades boa mas não se pode dizer que é unanimemente aceite, até por parte dos ciclistas. Existem alguns casos de conflito sistemático entre ciclistas e polícia, sendo eventualmente o caso mais conhecido o de Nova Iorque e tem-se registado atitudes agressivas com brutais consequências por parte de automobilistas apanhados no meio da MC.

As Massa Críticas não são organizadas por ninguém em particular, são algo que existe, que se sabe onde e quando acontece porque se ouviu a algum amigo, se leu nalgum cartaz, num blog. Não são uma manifestação no sentido legal, porque fazem valer o direito que todos os cidadão têm de se deslocarem de bicicleta por onde bem entenderem desde que respeitando as regras aplicáveis, bem entendido. Prescindem deste modo de autorizações ou sequer comunicação às autoridades e do respectivo acompanhamento policial. Por esta razão não anunciam um destino ou um percurso, embora em algumas cidades exista um trajecto habitual e noutras terminem sempre no mesmo sítio. Mais frequentemente, e uma vez sufragado pelos participantes o destino, os massholes conduzem os demais ciclistas pelas ruas da cidade, seguindo uns quantos preceitos de forma a que o impacto no normal fluir do trânsito seja o menor possível.

As bicicletatas, como também são conhecidos as MC de Lisboa, têm tido nos últimos meses uma significativa adesão. Eventualmente fruto dum extraordinário Verão de São Martinho e indiscutivelmente graças ao aumento de commuters de bicicleta e ciclistas urbanos, Setembro terá reunido cerca de quatro centenas de pares de rodas em cortejo alfacinha. Por razões evidentes não foi possível confirmar este número junto da polícia, mas queremos todos acreditar que sim, 400 bicicletas juntas por Lisboa! Descontando um ou outro atrelado, mais umas quantas bicicletas com cadeirinha e algum tandem, podemos dizer que cada bicicleta seu ciclista, cada ciclista sua cabeça e cada cabeça sua sentença. Em tão diversa mole humana em movimento encontrar-se-ão seguramente espécimes de variadíssimas estripes. Por relatos variados na esfera bloguista, e noutras esferas mais quadradas, direi que por lá se encontrarão os habitués, os novatos, os estreantes, os bike-ninjas, os rufias, os betinhos, os chungas e muitos outros tipos que me podem fazer chegar pela caixa de comentários.

O confronto está presente no dia-a-dia de peões, de automobilistas, de ciclistas, em suma de todos quantos nos cruzamos nos dias-e-dias. Ele é a passadeira que não é respeitada, o lugar no comboio que não se dá à velhinha, a buzinadela desnecessária que sobressalta o transeunte, enfim um fartar de conflitos, uns mais físicos outros mais morais, para os quais contribuímos todos por acção e tantas vezes por omissão. Quando um bando de ciclistas resolve passear em plena hora de ponta pelo meio de concorridas artérias do centro lisboeta, se há coisa que provoca é, esta-se mesmo a ver, conflito. E a troco de quê? Da consciencialização dos demais cidadãos para a necessidade duma cidade mais amiga da bicicleta? Para afirmar o velocípede como alternativa à mobilidade urbana? Para reclamar o espaço alocado quase em exclusivo ao poluidor e gastador automóvel? Se respondeu sim a estas perguntas, responda lá a esta: e porque é que provoca conflito? Vou dar a minha resposta a ver se concorda.

Provoca conflito porque colide com desprevenidos cidadãos que vêem nas invasoras bicicletas um excelente alvo para a ira acumulada por uma vida cada vez mais difícil. Cidadãos que são donos da estrada todos os dias do mês, que têm no carro uma extensão do seu ego moldado numa sociedade egoísta. Colide porque contribui para complicar ainda mais a vida de pessoas a quem os participantes na MC só queriam dizer “andem daí pedalar connosco”, mas que também têm todo o direito de não querem que lhes digamos nada. Partilho da ideia que as bicicletadas deixam, por força do comportamento cívico da maioria dos participantes, uma imagem positiva em quem os vê passar. Da mesma forma sei serem “notícia” apenas os maus exemplos, o tal homem que mordeu o cão. Notícia é o taxista que se encosta à roda traseira duma bicicleta, é o ciclista que respondeu na mesma moeda ao exaltado condutor, é o peão que vocifera contra os “empatas”.

Houve recentemente uma viva e longa discussão no seio duma determinada comunidade ciclista exactamente sobre a questão comportamental dos participantes na MC alfacinha e foi esse debate, a que assisti com bastante atenção, que motivou inclusive este texto. São cada vez mais frequentes os relatos de participantes na MC que referem episódios que, segundo os relatores, em nada favorecem a causa ciclista. Se é verdade que não devemos tomar o todo pela parte, a verdade é que quando a parte, que embora não tenha a paternidade da Massa, advoga algum paternalismo, como que tendo pelo menos a custódia da coisa, decide andar às voltas numa rotunda e encazinar completamente o trânsito, ou quando opta sistematicamente pela rolha quando poderia simplesmente abrandar e esperar no semáforo seguinte pela reunião do grupo, ou quando decide uma passagem pelo aeroporto de Lisboa com as consequências que daí podem ocorrer, está à procura dum desfile que se faça notar também pelo engulho criado. Ou seja, o desfile que deveria ser uma festa para quem participa mas sobretudo para quem assiste, transforma-se numa manifestação de força e num embaraço desnecessário num já habitual caos. Assim como se um anúncio à aspirina fosse um sound-check do baterista dos Metallica.

Um evento que tem no próprio nome a palavra crítica tem forçosamente de saber lidar com a dita cuja e ser um fervoroso praticante da autocrítica. A desculpabilização dos comportamentos desviantes e a desresponsabilização do todo perante as consequências possíveis de atitudes menos ponderadas das partes não é um bom caminho. A bicicleta está na moda e nunca se conjugaram tantos factores favoráveis à afirmação dos pedais como alternativa. Neste momento arrisco a achar que é mais a bicicleta a promover os desfiles da MC que o contrário. Dizer que a MC é um movimento de cidadãos livres que podem fazer individualmente o que muito bem entenderem durante os desfiles é negar ao próprio movimento a razão de ser. É claro que os desfiles só são positivos de servirem para divulgar um modo diferente mas melhor de nos transportarmos. É claro que só valem a pena se contribuírem para formar melhores cidadãos com ou sem bicicletas debaixo dos rabos. O resto são massagens ao ego e vãs demonstrações de autoritarismos, snobismos, autismos, discriminação e preconceito.

PS: Em ralação ao facto de ter vertido tanto paleio e nunca ter ido a uma Massa Crítica, digo apenas que não preciso ser galinha para saber se o ovo está podre…

O PAÍS VAI DE CARRINHO

Posted in cycle of sighns with tags , , , , on 22 de Outubro de 2011 by Humberto

Sempre que um qualquer membro do actual Governo faz uso das cordas vocais o som que ouço é monocórdico, repetitivo, sem melodia e o ritmo é apenas um: uma batida dura em crescendo. A letra da cantiga já a conheço de cor. São versos pobres e sem rima bramida num ensurdecedor coro. Cada vez menos seguros de si, cada vez mais desafinados, tentam convencer-nos do luxo imerecido em que temos vivido por culpa, claro está, dos brutais ordenados que auferimos mais as artimanhas matreiras para extorquir à pobre Banca todos os milhões em empréstimos sem préstimo para comprar telemóveis, elcêdês e comer fora! Passamos a vida de férias nos brasis e fazemos uma dezenas de pontes por ano para gozarmos as casas de férias no Allgarve. Isto já para não falar que, apesar dos investimentos na excelência dos transportes públicos -praticamente gratuitos, lembre-se- nós, oh ingratitude! insistimos em perder horas, dias, anos! alapados no couro sempre novo de reluzentes topos de gama germânicos, engarrafados em autoestradas à borla!

Por todo o lado, todas as sapiências convocadas para nos iluminar a existência e não nos deixar transviar do caminho da salvação, nos dizem “Tens vivido acima das tuas possibilidades” e pronto, ponto final! Não, Portugal não é o campeão da desigualdade na distribuição do rendimento. Nem um dos países com a mais elevada carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho. Portugal não tem a energia nem os combustíveis mais caros da zona euro. Não, não tem à volta dum milhão de pobres (ou devo dizer, tinha?) quase outro tanto de desempregados, precarização galopante no mercado de trabalho, salários em acentuada desvalorização, consumo interno estagnado e não é um exportador de produtos de baixíssimo valor acrescentado! Tudo isto fruto de políticas com-ple-ta-mente ao contrário das soluções da tróica, levadas a cabo por Governos que nada têm a ver com o que agora alterna!

Alguém se lembra de ainda há poucos meses, os lustrosos banqueiros lusos se gabarem da rentabilidade recorde dos seus negócios? E a fuga de capitais para offshores? Ah, isto é só inveja do pobre! Os ministros, os dos ministérios e os outros sem pasta, falam e falam e falam e o que dizem é apenas, simplesmente, mais do mesmo: só saímos daqui continuando na mesma estrada que até aqui nos trouxe. E toca de nos tratar como criminosos que mais não sabemos fazer que extorquir, pelos meandros de subsídios para tudo e por nada, as riquezas ao país. Riquezas acumuladas por anos e anos de afincado, árduo e solitário trabalho dos senhores do dinheiro. Empresários empreendedores que graças à sua capacidade de liderança e inovação têm conseguido não ir à falência nem deslocalizar as fábricas para países com mão de obra mais cara…

Verdadeiros patriotas que não vivem à sombra do Estado nem aceitam um subsídiozinho que seja, nada! Mas nós, que até julgávamos que na China é que não havia essas mariquices dos 13º mês, não passamos duma cambada de imbombáveis, não contentes por ter trabalho ainda queremos também -imagine-se- ter salário. O que estamos mesmo a precisar é dum salazar para pôr isto tudo na ordem. Ou um portas que também serve. Acabava-se logo a rebaldaria, as greves e manifestações e esses abusos todos. E o leitor, ainda aí está? A ler isto? Vá mas é trabalhar mais meia horinha de borla. Apre! E que raio me havia de dar? O que tem isto a ver com as bicicletas? Que conversa de chacha vem a ser esta para um site sobre mobilidade suave ou lá o que isto é? Uma pessoa vem aqui à espera de encontrar um paleiozito sobre a cena da bicicleta e das ciclovias e ver umas fotos com gajas chiques e apanha com uma seca destas?

Não deixo de me perguntar quem são as pessoas que lêem estas escrituras. Serão pessoas que curtem a moda das bicicletas ou são masoquistas? Não deveria eu escrever apenas sobre correntes de elos e selins de couro e afixar uma fotos relatando os meus progressos no cultivo de courgettes? Será que faz sentido um ciclista burguês e suburbano se preocupar por agora ter menos ligações de barco entre as margens do rio Tejo? Será que um commuter que use a bicicleta se deve incomodar com o definhar da linha de Cascais? Ou será indiferente para quem escolheu a bicicleta como meio de transporte que a Carris tenha acabado com várias carreiras e reduzido a frequência de outras? Não é a bicicleta também uma forma de alheamento? então porque diabo nos havemos de preocupar com o desinvestimento no transporte público? Que importância há nas decisões políticas que empurram mais pessoas para dentro dos carros? Ou nem sequer é assim e os Portugueses, ou outros Portugueses claro, são burros e nunca vão sair da cepa torta porque é isso que está escrito no grande livro do desígnio nacional?

Será relevante para quem anda de bicicleta o facto de já só poder ir jantar à Trafaria de carro porque o último barco passou a zarpar de regresso à capital às 10 da noite, duas horas mais cedo que no inicio do Verão? Importará realmente a quem escolheu a mobilidade sustentável que querendo ir hoje sábado, apanhar o barco e pedalar na baía do Seixal, tem de regressar antes das 23? Ou então terá de pedalar até ao Barreiro ou Cacilhas e lá conseguir chegar a tempo de apanhar o barco das 2 da manhã. Esta é a perspectivava que tem quem vive na margem direita da foz do Tejo e atravessa o rio de barco meia dúzia de vezes por ano e o recomenda a visitantes outras tantas. A atracção que a outra banda exerce nos apetites gastronómicos dos lisboetas é equivalente à vontade de vir jantar a Lisboa para quem vive na margem sul. O efeito que terá nas necessidades supérfluas -dirá o ministro das finanças- o esvaziamento dos bolsos de alguns -digo eu- portugueses não justificará mesmo o fim das ligações fluviais entre as margens o Tejo para lá duns quantos barcos de manhã e outros tantos à tardinha?

Dirão que a vida não está para passeios e ir comer fora é um luxo. Está mais para eliminar certas gorduras. Além de que existem as pontes e o comboio e as camionetes. As populações ficam mais dependentes do carro? E qual é o problema? Quem quer ir paga que eu não estou para dar dinheiro dos meus impostos para alimentar gulosos! Serão estas questões assunto de bicicletas? Será que o aumento do preço dos bilhetes e a anunciada fusão das empresas de transportes importa aos ciclistas de Telheiras, de Campo de Ourique, de Matosinhos, de Carcavelos, de Águeda, de Alcântara, de Braga, do Parque das Nações, do Montijo, de Lordelo? E o abandono de 600 (mais, menos?) quilómetros de linha férrea?

Se há coisa que se aprende depressa quando a pedalada passa a ser diária, é a incapacidade de passarmos pelos intervalos da chuva. Está bem de ver que a tormenta que se abate sobre as nossas cabeças não vai passar só porque sim. Por muito que gostássemos que isso acontecesse, tampouco está prevista a entrada em Portugal dum contingente de holandeses e dinamarqueses munidos de ciclovias, pasteleiras pesadas e pós de perlim-pim-pim para transformarem as nossas cidades em réplicas temperadas das suas urbes. Infelizmente não será apenas pela actualização do Código da Estrada que a bicicleta entrará a bem na nossa vida metropolitana. A bicicleta é um factor que pode elevar, como tão bem sabemos, a qualidade de vida de quem optar por ela como meio de transporte. Por todos os cinco continentes sabe-se que a bicicleta é parte da solução para os problemas da mobilidade. No entanto poderemos nós, ciclistas convictos, alhearmo-nos do caminho pelo qual está a ser conduzido Portugal? Se é certo que da chuva resta-nos enfrenta-la ou esperar que passe, será que podemos alguma coisa contra o resto ou estamos bem assim?

Franz Liszt nasceu no dia 22 de Outubro de 1811 onde hoje é a Hungria. Virtuoso pianista e maestro, Liszt é mais conhecido pela sua faceta de compositor graças a uma vasta obra inserida no que hoje conhecemos por período romântico. Professor de excelência, formou vários pianistas nos quais sempre procurou valorizar e desenvolver a capacidade interpretativa individual, desvalorizando o rigor técnico e nunca procurando replicar-se nos seus alunos. Não cobrava pelas aulas porque via no mercantilismo uma forma de corromper a arte.

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