Findas as campanhas eleitorais, deitados nos contentores azuis os panfletos coloridos e cheios de amanhãs solarengos, arrumadas na memória esquecida as promessas repetidas, a vida retoma o seu dia-a-dia ritmado e metódico, qual cadência da pedalada numa bicicleta velha, enferrujada e desafinada.
A última eleição reorganizou o poder mais democrático de todos, o poder autárquico. Mais democrático porque mais curtas são as distâncias entre os que votam e os votados, tendo os segundos feito das questões da mobilidade assunto charneira das suas propostas apresentadas aos primeiros. Mesmo que por vezes a viragem tenha sido anunciada timidamente, as diferentes campanhas valeram-se de túneis, ciclovias e saca-rolhas para conseguir o nosso voto.
O transporte pendular das populações espalhadas por Portugal está, como em poucos países, dependente principalmente do transporte particular, ou seja do carro. Na área metropolitana de Lisboa a situação vivida diária e infernalmente por centenas de milhar de pessoas é insustentável e a solução não passará infelizmente apenas pelo recurso à bicicleta.
Mais que o cumprir de promessas, algumas avulsas quando não mesmo contraditórias, torna-se imperioso que os agora eleitos assumam a responsabilidade dum projecto moderno e sustentável. É urgente que as várias Câmaras da AML coincidam em políticas integradas de mobilidade. Isto dito assim parece um chavão. E é. Mas há que ter esperança que nos vários elencos camarários exista coragem política e massa crítica suficientes para cortar com este caminho de asfalto que nos trouxe a um beco sem saída.
Por aqui se anunciou, e se mostra agora, que a CDU de Grândola promoveu uma caravana de bicicleta. Cerca de quarenta pedalantes percorreram outros tantos quilómetros e pelo resultado da corrida se percebe que não os bastantes para chegarem à meta das urnas em primeiro lugar, mas ficou o pioneirismo da iniciativa. Nem sempre as melhores ideias obtêm o fins a que se propõem. O povo tem sempre razão.
Quatro anos é tempo que chegue para os autarcas mostrarem trabalho, definirem opções, realizarem obra. Em dois anos conseguirão, por exemplo, provar aos comerciantes que valeu a pena suportar a empreitada, calando o cepticismo mais militante. Olímpica tarefa a de pôr o engenho ao serviço da arte de fazer bem, que é como quem diz limpar e olear a bicicleta, ajustar os travões, substituir a corrente, trocar os pneus carecas. Haja vontade que a chegada valerá bem a viagem!