DE GERHY A GEHL
Há uns quantos anos a cidade de Lisboa teve por presidente alguém cuja obra que marcou o seu condado foi um buraco em forma de túnel com o mérito prometido e alcançado de meter mais depressa, mais carros dentro da cidade.
Esse senhor, dando seguimento ao imbróglio que ligou a CML e a empresa Bragaparques, os terrenos da Feira Popular e o Parque Mayer, resolveu contratar um gabinete de arquitectura conhecido por obras que não ficam exactamente escondidos em becos… conhecidos autores de alguns museus Guggenheim e do hotel Marqués de Riscal, Espanha.
Pelos serviços contratados à Gehry Partners foi paga uma quantia, digo eu… alta. E acrescento: foi paga muito justamente, já que o trabalho tem de ser remunerado, e afirmo-o porque andam por aí uns senhores amigos do ex-presidente a tentar impor o contrário, mas isso é outra história. Ou talvez não…
Bom, mas dizia eu que o contrato foi cumprido na medida do executado. Uns desenhos e umas reuniões e passa para cá os euros. Não escrevo considerações sobre a obra do mestre canadiano. A tanto não me alcança a pretensão! Sendo um arquitecto com obra espalhada por todo o mundo, considero um privilégio para a capital ter um edifício projectado pela dimensão de Gehry.
Não seria apenas o ego do edil presidente que engordaria com a assinatura de Frank Gehry pespegada numa parede de Lisboa. Eu, que associo à linha intelectual santanista os violinos de Chopin ou o CCBamarracho, reconheço modestamente que gostaria de também viver numa cidade Gehry, Lloyd Wright, Soutinho, Siza, Ando, Calatrava.
Duas ordens de razão assistem porém às minha dúvidas sobre a empresa do então autarca: primeiro, o lugar escolhido para acolher a mestria do arquitecto, a imponência do seu talento confinado num beco sombrio e segundo, relevância do projecto nas necessidades da cidade. Tanto por tão pouco.
De tudo quanto se gastou -ainda por cima em vão! o mais caro foi o tempo. Durante meses foi andando um comboio que chegou a lugar nenhum. O dinheiro foi-se e nada apareceu no seu lugar. O tempo passou e não se pode voltar atrás.
Quanto tempo e quanto dinheiro custaria ter pago por algo que em minha opinião, tarda por chegar: um projecto verdadeiro para reformar a rede viária? Um estudo sobre mobilidade e consequente acção transformadora? Quanto custaria, em tempo e em dinheiro, chamar Jan Gehl e Helle Søholt para virem conhecer o Cais do Sodré e a Mouraria, as Avenidas Novas e a Gulbenkian, o Fado e a luz -uma e outra, o maduro e o verde, a Senhora do Monte e as tasquinhas de Marvila, o Mercado da Ribeira e as bifanas, as chamussas do Martim Moniz?
Mas sobretudo, o quando se ganharia em dinheiro e em tempo!
O pequeno filme que se segue é uma viagem por Nova Iorque feita em jeito de estudo in loco por gente que passa a vida a tornar as cidades dos outros um nadinha melhores. Enquanto grande fã dos dotes musicais e escrevinhadores do anfitrião Byrne, ciclista aficionado e praticante, desde já me proponho para ser o Byrne alfacinha. Ofereço o meu tempo e, se for por ajuste directo, levo baratinho.
17 de Dezembro de 2011 às 23:21
Excelente texto meu caro.
As megalomanías de uns são a falta de mobilidade (e de euros) de outros. Subscrevo na íntegra a sua opinião e digo mais: se conseguir o tal trabalho por ajuste directo mesmo que baratinho, conte comigo para trabalhar em prol de uma cidade com (muito) melhor qualidade de vida e mais amiga de ser vivida na rua, lado a lado não com automóveis mas com bicicletas, táxis, autocarros e eléctricos. E claro, com os putos a que uma tal música se refere a brincarem desalmadamente na rua.
18 de Dezembro de 2011 às 15:13
É bom ver tantos principiantes nesta coisa de se deslocarem de bicicleta. Que outra explicação haverá para ver tantos ciclistas não profissionais de capacete? Será obrigatório lá pelos “states”? Se fôr, e se algum dia passear por lá, bicicleta será um meio de transporte a evitar.
19 de Dezembro de 2011 às 09:52
Julgo não ser obrigatório o uso de capacete em Manhatan. O único reconhecido nova iorquino que aparece no filme, David Byrne, não usa o leva na cabeça embora o use em alguns trajectos do dia-a-dia.
Não é garantido que os participantes sejam todos ciclistas habituados à cidade e julgo que o importante é pedalar, não a forma como queremos aparecer no filme…
Com e sem capacete, o número de ciclistas tem aumentado em praticamente todas as cidades do mundo. Em NY muito graças ao trabalho dos arquitectos do atelier Gehl e da vontade politica duma autarquia politicamente conservadora mas consciente das opções necessárias em termos de mobilidade.
19 de Dezembro de 2011 às 15:48
Não sabia que cantas como o David Byrne também?! Where is that large automobile?
19 de Dezembro de 2011 às 16:45
Não arriscar sequer pensar em trautear um faducho!
Acusar-me-iam de ser um psich-killer…