VAI UMA AJUDINHA?


Não é propriamente um tema original nem as maneiras como é geralmente abordado são muito variadas mas a verdade é que o futuro que nos andam a cozinhar tem travo amargo e vai ser de terrível digestão. Dum momento para o outro ficámos a saber que os cozinheiros dos costume nos querem servir mais desemprego e pior emprego, mais impostos e piores serviços, saúde e educação mais caras, menos investimento em transportes e preço mais alto pelos que existem, anunciando que tudo isto é para nosso bem porque em troca nos emprestam dinheiro e com isso enriquecem desinteressadamente, claro! pois se nem sabem bem que juro nos hão-de pedir… Oh ingratidão!

Vêm ajudar-nos como se nos últimos tempos tivéssemos desbaratado dinheiro em escolas e hospitais, como se o número de habitantes por funcionário público não fosse um dos mais elevados da OCDE, como se as falências não acontecessem já todos os dias nem houvesse já uma percentagem recorde de desempregados, como se o rendimento dos portugueses rivalizasse com o dos suecos. É que os lucros das grandes empresas portuguesas rivalizam com os das mais rentáveis do mundo! Os dividendos da Banca portuguesa são invejados e ainda mais os baixos encargos fiscais a que estão obrigados. Porque será que quase ninguém lembra que Portugal é o campeão das assimetrias sociais e onde a redistribuição do rendimento é a mais penalizadora para o fator trabalho?

A tão propalada competitividade obtém-se baixando o custo dos fatores de produção, é dos livros. Ora se em Portugal os custos da energia e dos transportes são dois dos fatores mais caros, porque raio não se aposta na redução dessas parcelas? Porque se insiste em aumentar o preço da eletricidade e em criar mais portagens e aumentando e degradando os transportes coletivos? Porque se insiste em desregular o mercado de trabalho, galopando na dorso da precariedade e do trabalho sem direitos? Nas medidas impostas pelos novos colonizadores, à pressa antes das eleições de forma a condicionar não só a opção livre que deve ser o acto de votar mas, e sobretudo a ação do governo que se vier a formar, a mobilidade dos portugueses continua a ser penalizada, diria mesmo desprezada. Um das principais razões da dívida nacional é a importação de combustíveis mas nem uma medida é anunciada no sentido de inverter esta dependência.

Estas perguntas, esta visão dos tempos presentes, fazem parte duma reflexão que anda infelizmente longe dos fóruns mediáticos e aperaltados. São coisas nas quais as pessoas não devem pensar muito ou arriscam-se a tornar a vida mais difícil aos gurus do pensamento único. Levar-nos a acreditar que só há um caminho, é meio caminho para que lá vamos ter pelos nossos próprios meios. Lembrar-nos que estes tempos são oportunidades de mudança, para a necessária alteração de comportamentos, seria lembrar-nos que talvez fosse uma boa ideia trocarmos de governantes, de políticas, de caminhos, de soluções. Mandaria a urgência do momento que andássemos a discutir como poderemos dar a volta à situação do país, como podemos resolver cada um a sua própria situação e contribuído dessa forma para a resolução dos problemas de todos. Mas não, olhamos à volta e vemos pessoas apáticas, sem ação, quase a tentarem passar despercebidas no meio das sombras, como se assim o que aí se anuncia as não apanhasse.

Pelos média somos tratados como uma cambada de acéfalos, mantidos por diárias manchetes ameaçadoras num clima de medo, onde nos repetem ad nauseam as mesmas patranhas, despejadas por gente conhecida por ter trilhado o caminho que nos trouxe até aqui, aparecendo agora como sendo os que daqui nos hão-de salvar. Estes são tempos sem dúvida alguma duros, em que os senhores da verdade nem se dão ao trabalho de nos apontar uma luz no escuro túnel da incerteza. Mas são também tempos duma excelente oportunidade para mobilizar as pessoas a dar novo rumo a velhos hábitos de vida, para que façam escolhas mais sustentáveis, para que se envolvam mais nas suas comunidades e contribuam na procura de soluções para problemas comuns. A valorizarem mais os recursos e a chamarem a si as decisões sobre o que lhes diz efetivamente respeito. A produzirem melhor e mais tendo por objetivo suprimir as necessidades locais e a rentabilizar o excedente.

Constantemente testemunhamos comportamentos que nos lembram o quão longe estamos da efectiva libertação dum modo de vida arcaico e falido. Carros em longas filas a queimarem inutilmente precioso combustível. Automobilistas que insistem em gastar dum semáforo a outro o que daria para toda a jornada. Excessos de velocidade que põem em risco a segurança de todos à nossa volta. Passeios degradados por estacionamento indevido. Ruas entupidas e transportes públicos que não avançam. Todos os dias ficamos mais para trás na solução dos problemas da mobilidade porque é preciso mudar um pouquinho de cada um para mudar muito do resto. Como diz a canção “Só há liberdade a sério quando houver / Liberdade de mudar e decidir”. A forma como nos movemos, a nossa mobilidade, é parte importante da liberdade de cada um e sinal da Liberdade na sociedade em que vivemos. Ao optarmos pela bicicleta damos um exemplo de como é possível a alternativa, contribuímos individualmente para a mudança coletiva, sem precisarmos que nos venham cá com ajudas manhosas!

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