O REI PEDALA NU?
Este artigo vem a propósito duma discussão lançada no fórum Conversas de Bicicultura onde se pergunta a opinião dos participantes sobre a pertinência duma iniciativa do tipo Corrida-de-Nus-em-Bicicleta na cidade capital. Esta manifestação, tal como o desfile da Massa Crítica, teve origem em lugares onde a realidade da bicicleta -já para não falar em tantas outras realidades- era e é bem diferente. Quem pedalava e quem não pedalava era encarado e encarava o outro, bem como o entorno, de formas mais, digamos, esclarecidas. Outra gente, outros costumes.
Lisboa -e escrevendo Lisboa, escrevo as pessoas de Lisboa- é uma cidade que precisa urgentemente de encontrar formas especificas de se indignar, de protestar, de marcar o debate, de ser mais afirmativa. Formas próprias de alertar para a necessidade duma mudança de atitude. Mudança a nível individual (dos peões e dos automobilistas que, eventualmente se cruzariam com a nacked), ou a nível institucional dos vários poderes com autoridade nestas questões. Até porque uma leva a outra. Recentemente, o vereador dos jardins de Lisboa -que é também o senhor que tem às costas as ciclovias- disse numa entrevista a uma publicação da própria CML- que a Avenida da Liberdade é uma rua difícil de se fazer a pedal, quando o caderno de encargos para a bicicleta de uso partilhado -de que o mesmo senhor é parte responsável- prevê uma bicicleta de mínimo 3(!) velocidade e um máximo de mais de 20 quilos(!). Gostava de ter lido alguma prosa sobre isto, mas ainda nada… ou quase.
E a mudança é necessária na forma como se aborda o problema da mobilidade em Lisboa. Um problema que é gravíssimo e para o qual a bicicleta é parte de solução. Se a bicicleta pode resolver alguma coisa, o estacionamento resolve, por exemplo, muito mais. Os commuters ciclistas alfacinhas podem contribuir para denunciar problemas e soluções para questões que não tenham a bicicleta no centro da “encenação”. Até porque qualquer iniciativa que beneficie quem anda a pé, beneficia praticamente sempre quem pedala. Não sei se me estou a fazer perceber?!
Chamar a atenção para a falta de passeios, para a falta de passadeiras, para a falta de esplanadas, espaços verdes e por aí fora, é chamar a atenção para a falta de condições para se andar de bicicleta, e é uma forma muito eficaz de levar a água ao nosso moinho. Acho as iniciativas do tipo ParkingDay, onde se permite a pessoas (ciclistas ou não) se sentarem onde antes havia uma lata estacionada, uma iniciativa muito mais adaptada à nossa realidade. Ou ocupar a faixa de rodagem em hora de ponta com várias estruturas, cada uma delimitando o espaço equivalente ao dum automóvel, com bicicletas (ou peões) no seu interior, bem mais eficazes que marchas de ciclistas a mostrarem partes do corpo de interesse muito subjectivo…
Num futuro que espero não estar assim tão longe como na verdade parece (confuso?) acredito que desfiles de gente em cima de bicicletas com o rabinho ao léu possam vir a ser viáveis e positivos, mas julgo ser necessário queimar algumas etapas antes. Dado o efectivo número de utilizadores diários da bicicleta em Lisboa versus o número de carros na cidade, é essa desproporção que tem de ser evidenciada, não a excentricidade do “nosso” lado. Em termos mediáticos seguramente que a naked conseguiria atrair muitos mirones, mas do que se transpiraria na imprensa da manhã seguinte ou nas televisões quase nada seria propaganda positiva a formas de mobilidade sustentadas ou a melhor planeamento urbano. E olhem que eu sei bem do que falo. Dar alternativas a quem ainda não encontrou a luz não é bem a mesma coisa que dar razões para nos escreverem nas costas mais uns quantos epítetos simpáticos…
26 de Outubro de 2010 às 14:58
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28 de Outubro de 2010 às 21:20
Eu voto neste post
29 de Outubro de 2010 às 15:50
Tambem gostei do link do ParkingDay. E’ incrivel o que projectos pequenos com um punhado de pessoas pode fazer…
9 de Novembro de 2010 às 15:42
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